Laços da China com o Irã complicam a diplomacia para os EUA

Os líderes do Comitê de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos foram a Pequim no mês passado para um encontro com as autoridades chinesas, levando um apelo de Washington: para que o Irã seja impedido de desenvolver armas nucleares, a China teria que dedicar um maior apoio diplomático à causa.

De fato, o apelo foi em grande parte respondido antes mesmo da chegada dos legisladores.
A televisão iraniana noticiou na segunda-feira
(28) que o país testou mísseis de longo alcance Shahab-3. Os foguetes têm alcance de cerca
de 2.000 quilômetros, podendo atingir, em tese, Israel e bases americanas no Oriente Médio

Em junho, a China National Petroleum assinou um acordo de US$ 5 bilhões para desenvolvimento do campo de gás natural de Pars Sul no Irã. Em julho, o Irã convidou empresas chinesas a participarem de um projeto de US$ 42,8 bilhões para construção de sete refinarias de petróleo e um oleoduto de 1.640 quilômetros, atravessando o Irã. E, em agosto, quase ao mesmo tempo em que os americanos chegavam à China, Teerã e Pequim fecharam outro acordo, desta vez de US$ 3 bilhões, que abrirá o caminho para a China ajudar o Irã a expandir mais duas refinarias de petróleo.

A série de acordos de energia deixou atônito o presidente do Comitê de Relações Exteriores, o deputado Howard Berman, democrata da Califórnia, que os considerou "a mensagem errada" enviada ao Irã, que parecia determinado a ignorar as regras nucleares internacionais.

Mas alguns analistas veem outra mensagem: enquanto os Estados Unidos fazem novos pedidos para punição ao Irã por expandir secretamente seu programa nuclear, não está claro que os interesses de Washington são os mesmos de Pequim.

Isso certamente tornará duplamente mais difícil, disseram esses analistas, conseguir qualquer sanção significativa contra o Irã no Conselho de Segurança da ONU, onde a China não apenas detém poder de veto, mas também é uma das defensoras mais confiáveis do Irã.

"A percepção de ameaça deles nesta questão é diferente da nossa", disse Zalmay Khalilzad, que, como embaixador dos Estados Unidos na ONU durante o governo do presidente George W. Bush, ajudou a persuadir a China a aprovar sanções limitadas contra o Irã. "Eles não veem o Irã da mesma forma que nós."

François Godement, um proeminente estudioso sobre a China e presidente do Centro Ásia, com sede em Paris, colocou de forma mais direta: "Basicamente, a ascensão do Irã não é uma má notícia para a China".

A China e os Estados Unidos, importantes membros do clube dos países nucleares, compartilham um interesse prático em deter a disseminação de armas nucleares em áreas voláteis como o Oriente Médio. E é do interesse da China evitar alienar os Estados Unidos, seu parceiro econômico e, cada vez mais, diplomático em assuntos de importância global.

Mas fora isso, dizem muitos especialistas, as diferenças entre os dois países em relação ao Irã não são apenas econômicas, mas também ideológicas e estratégicas.

Os Estados Unidos quase não possuem laços financeiros com o Irã, consideram seu governo uma ameaça à estabilidade global e temem que uma ascensão de Teerã possa ameaçar as alianças e acordos de energia dos Estados Unidos no Golfo Pérsico.

Por sua vez, os laços econômicos da China com Teerã estão crescendo rapidamente, e os líderes da China veem o Irã não como uma ameaça, mas como um aliado potencial. Nem os chineses ficariam preocupados, prossegue o raciocínio, caso um Irã dotado de armas nucleares minasse a influência americana na região e drenasse os recursos do Pentágono em mais manobras no Oriente Médio.Irã é alertado sobre fraude nuclear


"Os líderes chineses veem o Irã como um país de grande poder potencial, talvez já uma potência econômica e, talvez, militar dominante naquela região", disse John W. Garver, um professor de relações internacionais do Instituto de Tecnologia da Geórgia e autor de "China and Iran: Ancient Partners in a Post-Imperial World".

Uma aliança com Teerã, ele disse, seria uma defesa contra o que a China suspeita ser um plano americano para manter o domínio global, ao controlar a oferta de energia do Oriente Médio.

Além disso, a China depende muito das vastas reservas de energia do Irã - talvez 15% dos depósitos de gás natural do mundo e um décimo do seu petróleo - para compensar sua própria escassez. Estima-se que os chineses tenham US$ 120 bilhões destinados a projetos de gás e petróleo iranianos e a China é o maior mercado para exportação do petróleo iraniano nos últimos cinco anos. Em troca, o Irã tem importado ferramentas, maquinário de fábrica, locomotivas e outros bens pesados da China, transformando a China em um de seus maiores parceiros comerciais.

Especialistas em China dizem que o relacionamento está longe de ser unilateral. O Irã tem repartido habilmente suas reservas de gás e petróleo com as empresas chinesas, mantendo a exploração e o desenvolvimento como uma espécie de apólice de seguro para manter o apoio diplomático chinês na ONU.

Por sua vez, a China tem rejeitado as sanções mais duras contra o programa nuclear do Irã, cedendo principalmente nas restrições ao comércio de materiais relacionados ao programa nuclear e às ordens de congelar os ativos no exterior de algumas empresas iranianas.

Muitos especialistas questionam quanta punição Pequim aceitaria apoiar. O Irã já foi citado três vezes pelo Conselho de Segurança, com apoio de Pequim, por violar as proibições contra seu programa nuclear.

Em cada caso, Pequim concordou com as medidas apenas após as propostas americanas mais fortes serem diluídas e após a Rússia, a outra crítica no conselho das sanções mais duras e aliada do Irã, aceitar a proposta.

Um importante analista chinês, Shi Yinhong, da Universidade do Povo, em Pequim, disse em uma entrevista por telefone, nesta semana, que a China provavelmente seguirá o mesmo caminho caso uma nova proposta de sanções chegue ao Conselho de Segurança.

"A China se esforçará ao máximo para encontra um equilíbrio" entre o Irã e os Estados Unidos, disse Shi. Se a Rússia se juntar aos demais membros do Conselho no apoio a novas sanções, ele disse, "a China fará o que puder para diluí-las, para limitá-las, em vez de vetá-las".

Mas é improvável que o faça alegremente. Apoiar sanções mais fortes poderia elevar a imagem da China como líder diplomática global, mas os Estados Unidos, e não a China, colheriam os verdadeiros benefícios.

"A China não está ansiosa para embarcar neste trem americano", disse um analista chinês, que falou na condição de anonimato para poder avaliar livremente a política externa da China.

Tradução: George El Khouri Andolfato

 
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